Por Alvaro Rocha
Mercado de OTC e as operações com Ativos Virtuais: autorização para operar é necessária ou não?
Neste artigo serão abordados os aspectos regulatórios sobre a necessidade ou não de autorização para operar no mercado de balcão (OTC) com ativos virtuais. Exploraremos as complexidades regulatórias que envolvem essas operações, destacando os principais desafios enfrentados pelos participantes do mercado.
Operações em OTC
O termo “Over the Counter” (OTC), conhecido no Brasil como “mercado de balcão”, refere-se a um ambiente de negociação de diversos tipos de ativos que ocorre diretamente entre as partes envolvidas, sem a necessidade de uma bolsa de valores intermediária. Nas transações realizadas em ambiente OTC, compradores e vendedores negociam diretamente entre si ou por meio de intermediários financeiros.
É importante destacar que as operações OTC são frequentemente caracterizadas pela flexibilidade e personalização, uma vez que não estão sujeitas às regras rígidas de uma bolsa de valores. No entanto, essa flexibilidade também demanda uma atenção redobrada às normas em sentido amplo, principalmente compliance financeiro e reputacional (AML-PLD e due diligence).
Verifica-se que, em linguagem popular adotada no mercado de operações com ativos virtuais, alguns players batizaram este ecossistema de negócios como “OTC”, devido às características de informalidade e operações semelhantes. Porém, do ponto de vista regulatório, entendemos que estas operações com ativos virtuais não poderiam ser consideradas OTC, quiçá mercado de balcão não organizado, mesmo considerando o âmbito de aplicação da SOMAFIX.
Isso porque, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), autarquia vinculada ao Ministério da Fazenda, a qual compete, entre muitas outras atribuições, editar normas gerais sobre entidades do mercado de balcão organizado, emitiu em 10/06/2022 a Resolução CVM 135, segundo a qual considera-se realizada em mercado de balcão não organizado a negociação de valores mobiliários não realizada ou registrada em mercado organizado que integre o sistema de distribuição, seja como intermediário ou como parte.
Os ativos virtuais – em sua maioria – não possuem atributos jurídicos que possam determiná-los como valores mobiliários como demonstramos neste artigo, e sobre o registro de suas transações, trata-se, em sua maioria, da rede Blockchain, onde o registro é compartilhado e imutável, o que facilita o processo de gravação de transações e rastreamento de ativos em uma rede de negócios.
Tecnicamente, o uso do blockchain serve para transferir e registrar as operações de forma segura. Por exemplo, uma pessoa quer transferir algum ativo virtual para outra. Para realizar tal transferência, a pessoa terá que conseguir validação da rede do ativo virtual negociado. Sendo que a validação da rede é efetuada pelos próprios usuários do ativo virtual. Então, quando feita a solicitação de transferência (a operação em si), aqueles que estão na rede fazem a validação e automaticamente, registram a transferência no blockchain, adicionando mais um bloco na rede. Essa transferência é atualizada e registrada para todos os usuários da rede. Essa validação também é autenticada por aqueles que fazem parte da rede.
Exemplo de como se forma um ambiente de negócios em OTC
Em termos práticos, havendo uma pessoa (física ou jurídica a depender do contexto) que possua determinada quantia de ativos virtuais, queira vendê-los, e outra queira comprar e possua recursos de diversas naturezas que são passíveis de serem usados como meio de pagamento, seja moeda fiat, seja outros ativos virtuais, comprador e vendedor realizam o negócio; obviamente a remuneração do vendedor é o spread. Neste exemplo, caso o novo proprietário desses ativos queira negociar com outro interessado e o faça reiteradamente, com outros pares, forma-se um amplo ambiente de negócios, muito parecido com uma bolsa de valores, porém as operações são efetivadas com ativos virtuais.
Operações em OTC executadas com Ativos Virtuais
Nesse contexto, encontram-se as prestadoras de serviços de ativos virtuais, ou exchanges, que operam neste mercado e buscam melhor esclarecimento e direcionamento jurídico sobre a regulação de suas atividades, principalmente com o advento do “marco cripto”, o qual dispõe sobre adequações a respeito das quais as prestadoras devem atender para operar regularmente.
Cientes de que o Banco Central do Brasil (BACEN) está desenvolvendo tais normas até a presente data desta postagem, a principal preocupação dos operadores deste mercado é sobre a necessidade de pedir alguma permissão para a continuidade ou pedido de autorização para o início de suas operações.
Sobre as condições e prazos estabelecidos no art. 9º da Lei nº 14.478, de 21 de dezembro de 2022, para adequação das prestadoras de serviços de ativos virtuais que estiverem em atividade, foi emitido o Comunicado n° 40.874, de 6 de novembro de 2023, pelo Chefe do Departamento de Regulação do Sistema Financeiro do Bacen, segundo o qual:
Em função de dúvidas surgidas e externadas por agentes do mercado, comunico que as condições e os prazos para a adequação das prestadoras de serviços de ativos virtuais, mencionados no art. 9º da Lei nº 14.478, de 21 de dezembro de 2022, serão estabelecidos em ato normativo do Banco Central do Brasil, cujas normas serão aplicáveis a todas as prestadoras de serviços em atividade na data de entrada em vigor do ato.
2. Até que o ato normativo sobre a matéria entre em vigor, as prestadoras de serviços de ativos virtuais poderão funcionar independentemente de prévia autorização deste Banco Central do Brasil.
Essa disposição reconhece a ausência de regras específicas imediatas para operações com ativos virtuais, permitindo que as empresas e players do setor continuem suas atividades enquanto as normas detalhadas estão sendo desenvolvidas.
Contudo, é fundamental estar atento às atualizações legislativas e regulatórias, pois o ambiente jurídico pode evoluir, influenciando diretamente as operações no país.
Conclusão e opinião
Operar no mercado de OTC com ativos virtuais exige uma cuidadosa análise das exigências legais para evitar graves sanções do regulador nacional. A constante evolução das regras pode tornar a conformidade um desafio, onde uma interpretação equivocada ou o não cumprimento pode acarretar penalidades severas e prejuízos significativos. Cada operação deve ser analisada individualmente, considerando as particularidades dos ativos negociados e o contexto específico. Dessa forma, é possível mitigar os riscos regulatórios e assegurar a segurança jurídica indispensável para o sucesso das transações.
Contar com profissionais especializados, com experiência no mercado de criptoativos e OTC, é essencial para garantir que cada etapa seja realizada em conformidade com as regulamentações vigentes, contribuindo para operações seguras e alinhadas às exigências legais.